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Eu penso e fico paranóico

Contribuição do Abel Be para o Dia do Orgulho LGBT

Eu penso e fico paranóico. Então, sou gay? Pergunta sem remetente, hermética. Ninguém podia pensar, imaginar, sonhar… muito menos me ouvir. Responder já seria recibo de “viado”. Mas, os outros sabiam, eu sabia. Falavam que eu era “bichinha”, “gay”, enfim, crianças sabem ser cruéis, adultos também.

Hoje, 28 de junho, é dia do orgulho LGBT. Pergunto quantos, quantas, ainda não podem se orgulhar por medo, vergonha, próprio preconceito. Essa dicotomia “Orgulho X Armário” pauta a vida de homossexuais, ou pautou, com raras exceções, cada vez mais comuns, mas ainda assim escassas.

Neste contexto, celebrar a homoafetividade não é só para gays, mas para todo que pretendem construir uma sociedade melhor. Ou alguém defende que algum ser humano deva ocupar um lugar exótico eterno, como atração em um circo de horrores ininterrupto? Isso não é um projeto de vida, muito menos de felicidade. Tal posição é a ocupada por gays, já foi pior. Mudar o imaginário social não é simples, é um desafio. Não trata-se de um artifício retórico, é desafio mesmo, cravado.

Sem maiores digressões, ao longo da história gays serviram ao gozo do outro, tendo de se submeter ao sadismo alheio, fetichizado, enquanto alvos preferenciais e constantes de ódio. Emerge a questão: por quê? Arrisco afirmar que essa destrutividade só interessa ao recalque de quem não aceita a própria homossexualidade e precisa xingar, humilhar, diminuir, praticamente aniquilar o que nega em si mesmo.

Há um medo enorme em não ser aceito por fugir a norma, por ser diferente, medo esse não extirpado após tantas revoluções sociais. A questão, então, é subjetiva? Em parte sim. No entanto, se você tem problemas íntimos esta autorizado a cometer crimes em nome deles? A transgredir pactos sociais? Não, não esta. Esse é o ponto: gays foram vistos como criminosos, como transgressores dos acordos, códigos, interditos sociais vigentes de modo tão radical que lhes coube todo tipo de sanção. Afinal, ousaram fazer algo vetado a todos. Que tipo de pessoas especiais são essas? Que tipo de pessoas? O pior tipo, claro. Bem, fica fácil entender de onde parte a comparação com pedófilos, promíscuos, desonestos em geral etc A aliança entre o recalque, a culpa e o medo em aceitar a vontade de fazer o que esses seres desviantes também fazem é perturbadora, não era de se esperar que não fosse.

Quem não ficaria paranóico descobrindo-se gay diante disso?

Romper este ciclo é um desafio por conta dessa complicação toda, pois não se trata de algo consciente, controlável. É antes de tudo inconsciente. O Orgulho LGBT, portanto, é necessário. É um grito que rompe com essa visão deturpada que iguala gays a humanos torpes, no mesmo nível dos vilões de qualquer filme de terror. Parece bobagem, mas ouça os discursos homofóbicos: são discursos de medo, desespero. Não estou, é bom esclarecer, defendendo ou sendo condescendente com homofobia, mas alguém dúvida que esse preconceito seja medo de se ver em uma bela manhã gay? Surpreendido por um desejo incontrolável de não ser mais hetéro? Pois é.

O Orgulho LGBT é a luta pelo reconhecimento social, sem o qual não há respaldo para nenhum sujeito. Sem o qual gays serão sempre destinados ao exílio, ao circo de horrores ou a destruição pura e simples. Esse dia é por um mundo em que gays se descobrem gays como possibilidade e não como maldição. É, sobretudo, tanto para gays, heteros, quanto bi, ou o que for, um dia para viver sem medo. A sociedade não irá ruir se incluir a homoafetividade, não somos criminosos e sim gente.